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sábado, 16 de maio de 2009

Deufunto de Chumbo

DEUFUNTO DE CHUMBO (*)

Damião, do Alto da Cambambosa, era vaqueiro valente, forte e duro no trabaio.
Peuto do Alecrim, Sirvina, moça dereitcha, era uma fromusura só.
Damião já vevia cansado das rapariga do lugar. Toda semana passava o rodízio. E ninguma cobrava. Ele não sabia se era por medo ou proque elas gostava da sua taca.
Sirvina temia ficar no barricão. De oio todo home tava, ma, frente da belezura fartava corage. Só de oiar os home tremia as perna, as mão, a fala sumia, o coração subia.
Cum Damião num teve lero-lero. Bateu os oio na portranca e falô - Com tu vô casar.
Ela se sustô. Se picô num piscar d´oio. Mas, inda viu a cara de pedra, o olhar de aguíia e um bigodão de cauvão. Esta foi sua perdição. Sempre sonhava cum um bigodão.
Dois mês adispois era Sirvina na cosinha, na caminha, na hortinha, na caminha, na lagoinha, na caminha. Parecia uma pombinha. Num enxertô, mas, cuma treinô!
Ele tomém era marvado. Os boi era no ferrão, estropiava rês, descaderava bode e oveia.
Cuma ela era casada, num posso falar: a cara de louça, a boca um jambo. E o oio? Bolona de gude leitosa cum uma jabuticaba. Nem digo que as peuna era roliça, a cintura era de pilão e que a anca botava banca. O resto? A premera preferência é míia.
Bateu ciumeira no Damião. Pispiô a judiar a muié. Era palavrão pra lá, safanão pra cá, berros pra lá, leros pra cá, surra de currião, muitcha humiação.
Pra tanta malvação, uma vingação. Ele foi sartar uma ceuca, inscorregô. Na saída, lá dele, entrô uma estaca inté a boca do istombo. Ficô enrabado, entalado, envarado.
Uns parente, uns conhecido e uns inxerido leuvô o caixão. No rio, os home c´água nas canela, o carrego empacô. O deufunto pesô demais. Os home gritô - Acode gente.
Uma dúzia de home num guentô. Veio um carro-de-boi. Moço, cundo o caixão arriô na mesa, as roda fundô, os boi joeiô, o povo pasmô. Uns gritô - Os pecado virô chumbo.
A viúva que vinha na rabeira, carma e arliviada, vendo a frição, cramou - Sá Inhora do Menino Jisus apiede. Inhorinha, já perdoei ele.
Tudo vortô, inté mió. O caixão tinha asa, virô argodão. Pareceu inté que a terra queria o marvado. Cuma pode? Fartô terra do buraco discavado. Teve que pegar de fora. E os falatório começô já na vorta do sumitério:
- Aqui faz, aqui paga.
- O Tinhoso inda vai querer muitcho troco.
- Diantô arguma coisa. Deixô prosoto a viúva boa.
Foi pra Sumpalo. Ingora, eu inda sonho pecano cum ela. É um pirão de lamber os beiço!

(*) Minicauso, baseado no imaginário e um pouco no linguajar da nossa terra. Escrito por Rubem Ivo e já publicado em versos (Gió de Filó) no livro ANDANÇAS.

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