SERAFIM (*)
Não naufragou no mar de sua solidão.
Sobreviveu à dor da separação dos seus e buscou nas ruas de sua cidade, razões para viver. Conquistou amigos com seu jeito humilde e servidor; assim, conheceu e se fez conhecido dos caculeenses. Inteligentemente, buscava métodos que só a sabedoria de um filósofo é capaz de criar para integrar-se ao meio em que vivia.
Na pescaria fez companheiros; na música, conheceu a alegria; na bebida fez parceiros; nos “causos” que sua mente fantasiosa criava, fez expectadores e ouvintes. Um perfeito “Mambembe”, de esquina em esquina, contava aqueles fatos que só ele viveu, dentro de um mundo tão amplo e tão seu, onde efervesciam seus sonhos e onde guardava de forma tão íntima, talvez as suas dores, quem sabe seus amores...
Serafim viajava em uma estrela mágica e, etéreo, imprimia ações aos seres que não as possuíam, criava mitos e personagens que povoavam sua mente, acompanhando-o em aventuras onde Ele era o herói; assim, dava vozes aos animais, levantava os mortos, criava dinâmicas que só quem o ouvia contar com tal cunho de veracidade seria capaz de conceber e com ele viajar por um mundo tão irreal quanto atraente.
Para as crianças, um cumprimento alegre e motivador, ainda que brotando de uma articulação dentária disforme e feia, uma barba descuidada. Para os adultos exprimia um respeitoso “FALA,GENTE!” quando uma atitude lhe despertava malícia, ou diante de algo pouco esclarecido, exclamava, de forma bem pessoal: “ ÓÓÓÓIA !”
Pobre Serafim: um sorriso permanente, uma mente criativa, um Dom Quixote, para quem sonhar era preciso...
Gabava-se, em sua deliciosa fantasia, de ser conhecido no mundo inteiro. Contava ele, que, certa vez, um viajante quisera pôr à prova essa sua popularidade e convidou-o a fazer-lhe companhia em uma viagem por outras cidades. Por onde passavam, todos o aclamavam com carinho: “Ei, Serafim!” Nos limites da Bahia, nos estados vizinhos, em outras regiões mais distantes, ninguém desconhecia o famoso Serafim. Sua figura simples, carinhosa e amiga, invadia o território brasileiro e tornou-se um eco, o chamamento “OI, SERAFA!”
Encabulado com tamanha popularidade, eis que o viajante decide que viajariam pela Europa. E lá estavam os dois na Itália – Roma, mais precisamente. Em meio a tanta beleza, os dois se distanciam e perdem-se na multidão. O viajante enlouquece de preocupação. Dirige-se, então à Catedral Basílica de São Pedro para suplicar proteção ao Santo na busca do amigo desaparecido. Rezou, pediu, suplicou enquanto assistia à belíssima missa concelebrada. Chamou-lhe a atenção um celebrante alto, alvo, bem paramentado que presidia a celebração. Perguntou então a uma pessoa ao seu lado, quem era aquele celebrante. O italiano, calmamente, respondeu-lhe: o do bonezinho vermelho, eu não conheço; mas aquele escurinho que está lá ao lado dele, é Serafim.
E assim viveu nosso conterrâneo amigo. Vagando e sonhando entre caçadas e pescarias nos arredores da cidade, filosofando até onde pudesse levar-lhe sua mente etérea e pura.
Sucumbiu, vítima da violência e da crueldade humana.
Esteja em paz, Serafim! Continue contando seus “causos” aos anjinhos que, no céu, certamente o cercarão, para ouvi-lo em seus sadios devaneios e criações singulares e encantadoras
Saudades!!
(*) Dircinha esrcreveu este texto quando soube que Serafim foi encontrado morto na lagoa de Caculé, em 12 de julho de 2004.
Comocoxico
Local para contar estórias, causos, mostrar retratos, recitar poesias, encontrar e reencontrar os filhos e amigos de Caculé.
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contatos: comocoxico@gmail.com
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sábado, 2 de maio de 2009
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8 comentários:
Ô, Serafa... :( Só assim pra eu ficar sabendo...
Querida Dircinha,
Só mesmo você, com seu dom poético e eloquente, para lembrar do nosso saudoso "Sarafa". Dia desses estive com Moraes (Moreira) e ele me perguntou pelo "Neguim que tocava o bumbo cochilando", justamente o nosso Sarafa.
Abraço,
Betão
SSA, 08/05/09
Oi Neto!!!
Que maravilhosa idéia, fiquei encantada...chorei... vc me fez fazer uma viagem no tempo...obrigada! muito obrigada mesmo! ah! que tal falar sobre as festas de Reis , do boi de Dema, do Terno da Xitinha...fiz parte do Terno da Xitinha, quem realizava este terno era a filha de D. Bela. Será que ela tem fotos..?
ADOREI!!!!
Meu nome é Glória...apelido TIM filha de Nainha...
Fiquei muito emocionada ...Tinteiro, Lodaça, Miguel doido, Terno da Xitinha, Boi de Dema....
Gostaria de manter contato com estes conteporâneos, meu e-mail é:
gmarques54@hotmail.com
Nome: Maria da Glória Miranda Marques...apelido Tim....filha de Nainha.
Obrigada!!!
Caculé, terra maravilhosa de tantas histórias e cultura; estão de parabéns todos os que contribuíram e tornaram esse blog realidade. Conheci alguns ícones citados ( Serafim ) tive o prazer de escutar histórias do próprio, saudade imensa! Ao começar a ler algumas reportagens e histórias nem vi a hora passar e já tinha lido todo o blog; tudo muito perfeito.
“ Orgulho de ser Caculeense “
Valeu!!!
Mandarei depois outra do neguim Serafifim ou Sarafonfon.
Aurino do Rio do Antônio Nascimento.
Aproveite e pegue o Zé de Dila.
Boa noite, sou filha do serafim , você teria fotos da época que ele tocava com Moraes, se tiver algo me manda por favor
iaragss@yahoo.com.br
Serafim viveu tão bem que até hoje digo: Eh mentira Serafim não morreu.
Só mesmo Dircinha para retratar tão bem.
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